terça-feira, 30 de setembro de 2014

Telona #2 - O Labirinto do Fauno


Produtor: Guillermo del Toro
Título original: El Laberinto del Fauno
Duração: 118 minutos
Gênero: Drama / Ficção
Lançamento: 11 de Outubro de 2006




"Reza a lenda que há muito, muito tempo, no reino subterrâneo onde não existe mentira nem dor, vivia uma princesa que sonhava com o mundo dos humanos. Sonhava com o céu azul, a brisa suave e o sol brilhante. Um dia, burlando toda a vigilância, a princesa escapou. Uma vez no exterior, a luz do sol a cegou e apagou sua memória e qualquer indício do passado. A princesa esqueceu quem era e de onde veio. Seu corpo sofreu com frio, doenças e dor, e com o passar dos anos, morreu. Entretanto, seu pai, o rei, sabia que a alma da princesa regressaria, talvez em outro corpo, ou outro tempo e lugar, e ele a esperaria até seu último suspiro, até que o mundo deixasse de girar..."

   É com a narração desse pequeno texto que tem início esse espetacular filme do diretor espanhol Guillermo del Toro, responsável também pela direção de Hellboy, e mais recentemente fazendo uma importante participação no jogo Silent Hills. Embora o título sugira que o filme "O Labirinto do Fauno" possua uma temática fantástica e infantil, nós da Taverna advertimos: pense duas vezes antes de assisti-lo com seus filhos! Mesmo possuindo uma forte veia fabulosa e lendária, a produção conta com diversas cenas fortes e marcantes envolvendo violência excessiva e personagens macabros.


ATENÇÃO: ESSE TEXTO CONTEM SPOILERS, LEIA COM CUIDADO!


   O filme nos leva para a Espanha de 1944. Tecnicamente a Guerra Civil já havia sido encerrada, entretanto um pequeno e determinado grupo de rebeldes ainda lutava contra o fascismo nas montanhas ao norte de Navarra. Em meio a esse cenário, Ofelia [Ivana Baquero], uma garotinha de apenas dez anos e que perdeu o pai na guerra, é forçada a se mudar para essa região, juntamente com sua mãe Carmem [Ariadna Gil], que se encontra esperando um filho de um sádico fascista, o general Vidal [Sergi Lopes], o general responsável por aniquilar o que ainda resta dos rebeldes. Ofelia claramente não é a favor da junção entre sua mãe e o capitão e na verdade nem mesmo Carmem é a favor de tal casamento, mas assume que essa é a decisão correta a se tomar, visando seu futuro e o de sua filha. Será mesmo?
   Com a gravidez, Carmem fica enferma e não pode nem mesmo sair da cama. Solitária, Ofelia logo faz amizade com Mercedes [Maribel Verdú], uma jovem cozinheira da mansão, que também é o contato secreto dos rebeldes. Em um de seus passeios pela imensa mansão, Ofelia acaba encontrando um labirinto de pedras quando guiada por uma fada em forma de inseto, e lá acaba conhecendo o Fauno [mímico Doug Jones], uma figura híbrida metade humano e metade bode. A figura misteriosa e magnífica conta a Ofelia a história da princesa do subterrâneo e diz que ela é a reencarnação dessa princesa. Para poder voltar ao mundo do subterrâneo a garota precisa realizar três tarefas antes que a lua cheia chegue.



   Nessa obra do diretor del Toro, realidade e ficção se misturam, de um lado temos Ofelia, uma garota inocente e apaixonada por livros de contos, acredita em fadas, seres mitológicos e o principal, no amor ao próximo. Do outro lado temos o general Vidal, uma figura rígida e inflexível criada por um cruel sistema político, frio e arrogante, o general desconhece o significado da empatia. Uma hora as histórias dessas duas pessoas irão se cruzar e fica difícil saber o que esperar disso.
   Em momento algum o filme faz distinção do que é real e do que é fantasia, deixando sempre um ponto de interrogação para que o público acredite no que quiser. Por um lado a trama nos mostra a forte realidade da vida do general Vidal, em uma luta, que ele considera honrada, contra os rebeldes para extinguir qualquer força que se manifeste contra o Fascismo, segundo palavras dele mesmo no filme, não há lugar mais honrado para morrer do que no campo de batalha lutando pelos seus ideais. Engravidou Carmem apenas para que pudesse ter um descendente, tanto que quando a mesma ficou doente devido à gravidez ele deu instruções claras para o médico: "Se estiver entre a vida dela e a do bebê, salve a criança". Fica claro que o general não possui qualquer vestígio de sentimentos que não sejam o ódio e o orgulho, tanto que ele é responsável pelas fortes cenas de violência e assassinato, que inclusive fizeram com que o filme fosse proibido de ser exibido na Malásia.



   Do outro lado a trama nos mostra a mente fantasiosa de Ofelia, que vive cercada por fadas e seres místicos, e precisa realizar as três tarefas que foram propostas pelo Fauno. As "tarefas" que são designadas à garota não podem receber outro adjetivo que não sejam bizarras. Primeiro ela precisa entrar em uma árvore e confrontar um sapo gigante que se alimenta da energia dessa árvore, para poder resgatar uma chave que se encontra em seu estômago, e como se isso já não fosse anormal o bastante, a segunda tarefa proporciona uma das cenas mais grotescas que já vistas no cinema: Ofelia precisa ir até uma sala de jantar e resgatar um artefato que se encontra em uma caixa que só pode ser aberta com a chave que antes estava no estômago do anfíbio gigante. A garota recebe claras instruções do Fauno para que não coma nada do que se encontra sobre a mesa de jantar, caso contrário algo ruim poderia acontecer, e manda duas fadas para ajudá-la nessa tarefa. Ao chegar na citada sala, Ofelia se depara com um ser pálido, imóvel e desprovido de face sentado em uma ponta da mesa, e na sua frente há um prato com dois olhos. Ao redor da sala a garota se depara com pinturas que apresentam ilustrações fortes, onde esse ser, que até então continua imóvel, está matando, esquartejando e dilacerando crianças com toda a crueldade que podemos imaginar. Mesmo assim a destemida garota vai até a caixa e resgata o artefato, porém na volta não se contem e, mesmo com insistentes tentativas de impedimento por parte das fadas, come alguns doces que se encontram sobre a mesa. Após isso o bizarro ser se levanta e coloca cada um dos olhos que se encontravam no prato em orifícios em cada uma de suas mãos e sai, em uma caminhada assustadoramente esquisita, de encontro com Ofelia. Mas mesmo apesar dos contratempos a garota consegue fugir do lugar à salvo, infelizmente as fadas não têm a mesma sorte. 



   Ambos os seres bizarros que a garotinha precisa confrontar são fortes alusões às crueldades que o general Vidal fez no decorrer de sua vida, e com isso del Toro nos passa a forte impressão de que, por mais assustadores e cruéis que sejam os seres místicos da imaginação de Ofelia, os seres humanos do mundo real são ainda piores. Em meio a essas tramas paralelas, a mãe da garota acaba falecendo ao ter o bebê, o médico acaba morto por desobedecer as ordens do general, porque, segundo palavras do mesmo: "Obedecer sem pensar não faz sentido, isso é coisa que homens com o senhor fazem". Mercedes acaba sendo descoberta, mas consegue fugir após desferir algumas facadas no general. Ofelia tenta fugir com o bebê, contudo é encontrada por Vidal, que mesmo esfaqueado dispara contra garotinha sem pensar duas vezes e toma o bebê de seus braços, mas para o azar do general, minutos depois os rebeldes o cercam, resgatam o bebê e o matam, acabando de vez com seu sanguinário legado. 



   Após falecer, Ofelia descobre que essa era a terceira tarefa, um sacrifício por alguém que ama, e agora que todas as três já foram realizadas a garota recupera as memórias de quando era uma princesa do submundo, fazendo com que um final muito triste acabe com uma pontinha de esperança. 
   Realmente é uma trama muito bem elaborada e nos mostra que às vezes a inocência e a imaginação são necessárias para podermos fugir de um mundo cruel, o figurino e a maquiagem são excepcionais e foram super premiados, e não só o Fauno, como todos os seres místicos que aparecem conseguem nos causar arrepios. Ponto também para mímico Doug Jones, que faz não só o papel do Fauno, como também do homem pálido, que são de longe os dois personagens mais marcantes do filme. Se você é fã de dramas que mesclam realidade nua e crua com fantasias e fábulas, O Labirinto do Fauno é um título indispensável em sua prateleira.








Curiosidades

  • O filme foi censurado na Malásia devida à excessivas cenas violentas;
  • Guilherme Del Toro declarou que grande parte da estética do filme está relacionada com a imagem do sistema reprodutor feminino. Pode-se observar isso nas formas da árvore onde está o sapo e os espirais de sangue no livro de Ofelia;
  • Doug Jones, que interpreta o Fauno e o Homem Pálido, em Hellboy deu vida a Abe Sapien;
  • Doug demorava cinco horas para transformar-se no Homem Pálido, e uma vez fantasiado, tinha que olhar pelos buracos do nariz;
  • Doug era o único americano do set, e o único que não falava espanhol. Além de memorizar suas falas em espanhol, também tinha que memorizar as de Ofelia para saber quando ia dizer as suas, pois os mecanismos da fantasia que faziam suas expressões faciais se moverem não o deixavam escutar as frases;
  • O filme foi vencedor de 3 Oscars, Melhor Direção de Arte, Melhor Fotografia e Melhor Maquiagem, além de outros 68 prêmios;
  • Segundo Stephen King: O melhor filme de Fantasia desde o Mágico de Oz;
  • O filme recebeu 22 minutos de aplauso no Festival de Cannes;
  • As pernas do Fauno não foram criadas digitalmente. Del Toro idealizou um sistema especial no qual as pernas do ator controlavam as pernas falsas do Fauno. As pernas do ator foram posteriormente removidas digitalmente;
  • O povoado em ruínas que aparece durante a sequência de abertura é o velho povoado de Belchite (Zaragoza). Foi destruído durante a Guerra Civil Espanhola e nunca se reconstruiu;
  • Todas criaturas do filme eram imaginadas por Guillermo em sua infância. Ele alega que via o Fauno atrás do armário da casa de sua avó.


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